segunda-feira, fevereiro 26

Fuga Numa Ginja Tinta

Demasiadas, sei eu hoje que foram, as cenas em que me entreguei aos bebericares solitários nocturnos. Numa repetição mecanizada de levantar pousar o copo e esvaziar a garrafa pousada na mesa das minhas lamentações, perdi a noção do cerne da questão que edificava o meu estado de dilaceração. Nunca foi sede nem vontade de beber. Sempre foi vontade de esquecer. Compreendo hoje tudo isto por ver meu corpo impresso contra o beco da fuga. Não existem mais saídas, perdi a imaginação e o vinho também se acabou. Que seja arrebatada pelo que sentir não quis outrora e que compensei com as inebriações provocadas pelo tinto desejo de tragar a doçura da vida. Enchi-me de ginja até sentir a boca adocicada e a ressaca amarguíssima de uma dor trespassante pelas têmporas devido a esses excessos. Excedi-me, de facto, na procura pelo esquecimento e sequiosa todas as manhãs seguintes acordei até que hoje não há mais água para me acalmar a boca. Bem-vindo ao final da fuga.

1 comentário:

Anónimo disse...

Ora viva!

Óptimo texto. Sabe, deve ser uma mulher ainda nova, isto porque a sua escrita ainda não padece de clichés ou maneirismos. Embora também haja uma atmosfera de descoberta envolta nas suas palavras.

Ou então não é nada disto e eu estou para aqui a dizer baboseiras.
Mas atenção: gostei mesmo do texto.

Um abraço...
shakermaker