quinta-feira, agosto 17

Garrafas sem Tara de Retorno

Cesso o ver ao pousar as minhas palpebras totalmente sobre os meus olhos. Não quero ver mais do que aquilo que imprimido na minha íris gravado ficou-me na mente. Suspiro; para mim chega. Mudem-me o estado, estou ausente. Interregno ansiado que exasperante me tomou a mente e me agitou as mãos. Tremuras irreflectidas corporais alongadas pelos intervalos de tempo. Parou!, que se pare a vida e o caminhar do tempo, essa medida de todas as coisas perecíveis. Morte à memória, primeiramente, para que então se possa atingir o verdadeiro alvo: a recordação. Sou poetisa das memórias prosaicas. Vivo do ar viciado do passado, sempre o mesmo respirado, nunca renovado. Sistemáticamente me reporto ao que já se findou, às coisas que existiram cujo carácter fora sempre breve. É o meu modo de lhes negar o fim, de me negar a mim o fim, de ver o que assisto diariamente sem enxergar. Memórias, barcaças das minhas evasões desta realidade presente. Recordar é o meu modo de obrigar a vida a continuar. São vícios do corpo irreprimíveis como os fumos saturados a nicotina que inalo, assim como, os bebericares adociados dos nectares embebedados. Bebidas alcolizadas, não é o corpo, são os líquidos que nele circulam, a carne é notóriamente jovem incurruptível. A carne não se contamina é a mente que sucumbe e se vicia! Vícios, transtornos, reflexos de uma mente desajeitada clarificada pela benção das uvas brancas. Tranlúcidas àguas vertidas do rosto, remorsos aquosos, pesares que empurram as àguas face abaixo e me pingam no copo diluindo os seus fortes conteúdos. Abaixamento das densidades!, a dor continua a mesma a vida é que se distende ao sofrer a dilatação do tempo. Choro. Navegações elitistas. Somente as tristezas embarcam nas barcaças atracadas ao meu Tejo. Porto de partida aos destinos escolhidos no meio do que já se devia ter esquecido. Tristezas, rumos a outros aconhegos. Recordações minhas traições dos principios que professo ao elevar ao alto a voz. Luto, sim! O retrocesso é a minha guerra. Permitam-me que descarregue no rossio do sorriso que no passado tive a minha presente tristeza. Só mais um golo, um pingo que seja, uma gota da felicidade que experiencei cuja marca na mente guardei que de tantas vezes relembrada se foi bebendo. A garrafa está quase vazia, pára tudo!

segunda-feira, agosto 14

Curtidos

Indefesa me sinto aquando da falta tua. É bruma que me envolve, água ardente que me consome, me queima com a chama da luz que perdi - nos seus braços toma a protecção que contigo levaste assim que partiste. Molham me o rosto os contentamentos idos com a corrente. Á sua partida tudo já eu sabia. Conhecia os hipotéticos, os ses constituintes dos segundos que voam diariamente que me levam consigo nas suas asas aladas por um sonho. Voo, rasgando o firmamento, o céu por inteiro em busca das luzes que as fotografias nossas passadas tinham, aquela cor antes de hoje estar desbatida, como eramos nós antes de sermos curtidos pelo tempo.
Tudo Perece na Mao do Esquecimento, Excepto Nós....

Tudo hoje me reporta a nós. São murmurios longíquos de um passado que consumamos a dois que, gotejante, hoje me pingam o rosto. Dissabores diários ou talvez apenas de hoje enquanto de ti me vou recordando. Tudo hoje me pesa; as memórias, as imagens mentais que se vão deliniando pouco a pouco com o lápis que a saudade escreve. Não sei precisar o que se passa com a minha vista que hoje tudo enxerga de outro modo; modo esse como nos servimos da casa, os locais onde nos deitamos, as paredes que nos encontraram, os obstáculos que se imposeram nos nossos trajectos, o chão sobre o qual caimos enlaçados nos nossos corpos. Abro as janelas ao ar, ao ar desses tempos que já vão longe, ao ar de outros ares, ao ar que respiraste comigo, ao teu expirar. Inspiro de novo o cheiro teu intensificado pelo desejo te me sentir abraçada por ti como naquele ontem que irrompeste porta a dentro e me tomaste em ti. Já lá vão, caminhando em direcção à morada inexistente do esquecimento, esses reais sentires. Presentemente o teu rosto não é mais que uma ilusão que as minhas mãos fantasiosas acariciam. Não és mais o que para mim um dia foste. És a sombra que me encobre o rosto quando a noite me procura. Pesam-me estes pensamentos secos despojados do encantamento teu registado na minha mente. Temo, tudo mudou e nós também. Procuro em mim a negação do que hoje já não somos. Procuro para mim o que um dia fui para ti, procuro somente um pouco do conforto, não o teu, mas sim, como o teu. Minto, ou talvez omita... São saudades.
Suaventemente o vento passa,
Numa rissada mais grosseira me ataca;
São chicotadas que me trespassam.
Dão ao ar as vistas da minha entranhas
Remexidas pelas brisas que as envolvem.
Sou eu envolta nos ares destes dias
Exasperante pela oxigenação insuficiente;
Inalo e nada respiro. Grito, tudo permanece.
Olha a calçada que pisas, essas pedras polidas,
São os retratos das fricções dos meus despojos
Contra o chão.